(obrigada por pintar tantas casinhas, Monet)
O Sol se põe com
uma letargia descomunal, em mais um fim de tarde qualquer. Meus olhos estão
fixos na tela borrada com as mais diversas cores – antes apenas manchada de um
branco sonso, sem gosto. Sinto um orgulho quase irreal, como se tal obra fosse
minha. Talvez seja por ser um trabalho seu, tão amado e tão considerado, que
esse sentimento ganhe forças em mim.
Aperto os olhos
com força, tentando visualizar a casinha pintada ao fundo da paisagem. Ali
parece ser um lugar tão calmo, repleto de uma paz que a cidade grande não traz.
O lugar perfeito para se viver com o seu amor, criar seus filhos, fugir da
rotina imposta pela mídia e pelo Sistema. Deixo que meus pensamentos voem até a
trilha que leva à casinha simples, e penso se não seria melhor largar tudo
aqui, na cidade grande, e correr para lá com você. É uma possibilidade a se
pensar.
Atento-me agora
ao pequeno lago cristalino, que se localiza há não mais que quinze metros de
distância da casa simplória. O lugar parece ser confortável na paisagem
primaveral, e me pego pensando como seria nadar naquelas águas calmas com você
ao meu lado, em um verão qualquer nos dias de dezembro. Ou melhor, com nossas
pequenas crianças (sim, minha querida, você sabe que serão mais que duas).
Tenho tempo
suficiente para observar o gracioso jardim que enfeita a frente da casa. Das
mais variadas flores, você conseguiu unir cor e beleza, como sempre. Mas não há
tempo para me ater aos detalhes do céu, pois você me encara com a expressão
brava e as mãos na cintura. Seguro um sorriso ao observar o quão bela você fica
assim, toda suja de tinta e com uma pintinha branca borrando seu nariz. O
eterno mistério será como ela conseguiu ir parar lá.
Rapidamente, ando
ao seu encontro e evito que qualquer discussão comece. Eu sei que deveria
deixar que a obra fosse finalizada antes de ver, mas é impossível não observar
a sua concentração enquanto pinta. É uma das cenas que me fortalece nos piores
momentos.
Beijos seu lábios
com carinho, àquele que um dia juramos jamais deixar morrer. Seguro seu corpo
junto ao meu, em mais uma promessa muda de que sempre estarei aqui, ao seu
lado.
Finalizo o
contato com um sorriso, dando-lhe às costas e me dirigindo à porta. Sei que
daqui algumas horas você irá me encontrar em nosso quarto, com o sentimento de
dever cumprido e um sorriso brilhante em seus finos lábios. Não resisto, e
antes que a porta do ateliê se feche, comento:
– Eu adoraria ser
a sua companhia nessa paisagem... é uma ideia a se pensar. – seus olhos brilham
em alegria, e antes que a conversa se estendesse fazendo com que você perdesse o foco, saio do
quartinho improvisado com um grande sorriso iluminando meu rosto.